Driver e Grand Theft Auto: Uma Rivalidade Esquecida

A rivalidade entre Driver e Grand Theft Auto ficou no passado, mas um dia desses parei para pensar sobre o quanto ela foi importante para a consolidação dos jogos de mundo aberto.


Era sábado de manhã, meu dia favorito da semana.

Sempre que eu conseguia guardar algum dinheiro, usava para colocar “combustível” no meu Playstation.

O combustível neste caso eram os jogos, e o “posto” era a loja de videogames que ficava no centro da cidade.

Isso significava que naquele dia frio de sábado, minha viagem em busca de um novo jogo para curtir no fim de semana estava garantida.

A única coisa que me deixava mais feliz do que ir à uma locadora de games, era ir a esta loja, comprar um game.

E assim fomos, eu e meu irmão nessa jornada.

É interessante dizer que na época do Playstation havia realmente uma sensação de aventura ao nos dirigirmos a uma loja de games.

Num mundo onde o acesso à internet ainda não era tão comum e o próprio Google estava longe de ser o que é hoje, não haviam sites entregando informações atualizadas sobre games aqui no Brasil, este papel (com o perdão do trocadilho) ainda era das revistas.

E quem é dessa época também vai se lembrar: ainda que as revistas fossem muito boas, não conseguiam acompanhar a velocidade dos lançamentos.

Ou seja, mesmo que você comprasse todas as revistas das bancas, ainda assim haveria uma chance real de encontrar na loja um jogo totalmente novo, que só apareceria na revista do mês seguinte.

E foi exatamente isso que aconteceu naquele dia.

Ao entrar na loja, vi um grupo de vendedores e clientes em volta da TV principal da loja, onde um Playstation ficava ligado para demonstrar os jogos do momento.

Quando consegui um espaço para observar a tela, ficou claro o que causava tanta admiração naquelas pessoas.

Havia chegado um jogo que se chamava Driver.

Naquele momento não existia nenhuma revista falando sobre ele, tudo o que estávamos vendo ali era em primeira mão.

Pairava no ar a certeza de que todos nós estávamos presenciando algo épico.


Driver: You Are the Wheelman

Eu sei que hoje pode parecer estranho, mas acredite, Driver era um jogo incrivelmente lindo para a época.

Havia até mesmo um modo cinematográfico, que fortalecia o aspecto de filme policial.

Mas é importante observar que o departamento gráfico não era o único que impressionava, ele trazia possibilidades totalmente novas, mostrava o que ainda era possível fazer com o hardware do Playstation.

Por exemplo, o carro tinha suspensão e física realistas, além de um sistema de danos bem convincente.

Um detalhe que eu gostava bastante era quando fazíamos uma curva em alta velocidade e a calota escapava, saia girando pelas ruas.

Além disso tudo, havia certa liberdade para guiar o carro pelo mapa.

Sim, havia um contador de tempo nas missões, mas a possibilidade de chegar a um mesmo destino através de rotas diferentes flertava com o sonho de um jogo de mundo aberto.

Ainda não era possível produzir um jogo de mundo aberto com a tecnologia da época, mas já existia o desejo de um jogo assim, isso já habitava o imaginário das pessoas.

Eu, meus amigos e com certeza a maioria dos fãs de videogames ficavam imaginando como seria quando os videogames fossem tão avançados que poderíamos andar livremente pelos mundos, construídos em 3D.

E Driver com certeza foi um dos que mais chegaram perto de realizar este sonho, ao menos dentro das limitações do primeiro Playstation.

Até hoje me lembro da sensação de absoluto espanto quando liguei meu videogame e vi que eu realmente podia controlar aquele mesmo jogo que eu havia visto na tela da loja.

Claro, meu primeiro desafio foi descobrir o que raios era um slalom.

A primeira fase era um pequeno tutorial que nos desafiava a fazer manobras, sendo uma delas o temido slalom.

Depois de descobrir como executar a manobra e passar do tutorial, foi só alegria.


Mas o que Grand Theft Auto tem a ver com isso?

O primeiro jogo da franquia Grand Theft Auto já existia nessa época.

Muitos fãs de Grand Theft Auto não tiveram a oportunidade de experimentar os dois primeiros jogos, mas a maioria sabe que estes eram bem diferentes do padrão que a franquia possui hoje.

Grand Theft Auto 1 não era um jogo ruim, de forma alguma.

Era um jogo divertido e, ainda que não fosse tão conhecido, conquistava o coração de quem lhe desse uma chance.

Quem jogou com certeza vai pelo menos lembrar das incríveis músicas que tocavam ao entrarmos nos carros.

Não haviam controles de rádio como nos GTAs modernos, ao invés disso, cada carro tocava uma música que se parecesse mais com seu estilo.

Por exemplo, um carro veloz tocava rock, uma caminhonete tocava country music e assim por diante.

Ele já se mostrava bastante controverso e este com certeza foi um dos pontos que o fez chamar a atenção.

Também já oferecia certa liberdade, mesmo através de sua simplicidade.

Ideias como a perseguição policial para punir o jogador quando este causasse o caos também já estavam lá.

Mas aquele jogo em 2D, com gráficos simples e visão aérea ainda estava longe do tão sonhado realismo dos gráficos 3D.

Estava longe de ser um… Driver.


Driver 2: The Wheelman Is Back

Pouco mais de um ano após o lançamento de Driver, sua sequência chegou ao mercado.

E “chegou chegando”, com o pé na porta.

Arte de Driver 2

A franquia já tinha feito seu nome e apesar dos riscos inerentes a lançar um novo jogo perto do fim de uma geração de consoles (no caso a do primeiro Playstation), Driver 2 foi aquilo que podemos chamar de sequência perfeita.

Tudo o que era impressionante no primeiro jogo ficou ainda mais impressionante no segundo, inclusive os gráficos.

Havia até mesmo uma fase no Brasil, algo que levou os fãs ao delírio, era raríssimo ver o Brasil aparecendo nos games.

Mas sabe qual foi o toque final para explodir a cabeça de quem já era maluco por Driver?

Agora poderíamos sair do carro e andar com nosso personagem!

Era simples, não haviam muitas interações, mas era muito impressionante poder sair de um carro e entrar em outro.

Os jogos de carros eram somente de carros, os jogos em terceira pessoa eram somente jogos em terceira pessoa com fases delimitadas.

E só o fato de termos a combinação de “dois estilos de jogo em um”, ainda que de forma simplificada, já representava a quebra de muitas barreiras.

Era algo que se aproximava ainda mais do conceito de mundo aberto, fazendo os fãs sonharem ainda mais alto sobre quais seriam as possibilidades da próxima geração de consoles.

Driver 2 foi um absoluto sucesso, por aqui era difícil encontrar uma unidade a venda, algo que só me lembro ter visto acontecer com Tomb Raider 3 e Metal Gear Solid.


O Anúncio De Grand Theft Auto 3

Grand Theft Auto 2 saiu pouco tempo depois do primeiro Driver.

O segundo jogo ainda mantinha aquele mesmo estilo do primeiro, com gráficos em 2D, visão aérea e apesar de ser muito divertido, ainda não era o mundo aberto com o qual todos sonhávamos.

De qualquer forma podemos dizer que Driver e Grand Theft Auto eram concorrentes pelo menos no quesito liberdade, ainda que a distância entre eles fosse gigantesca naquele momento da história.

Quando o assunto era dirigir livremente pela cidade, Driver 2 ainda era o jogo a ser batido.

Foi quando surgiu o anúncio de Grand Theft Auto 3, que sairia logo no início da próxima geração de consoles.

Me lembro de ter visto uma revista fazendo um inevitável comparação, sob uma perspectiva de evolução tecnológica da nova geração, definindo Grand Theft Auto como “o jogo que Driver sempre sonhou em ser”.

Grand Theft Auto prometia mecânicas refinadas, gráficos inacreditáveis, além de um sistema muito mais profundo e repleto de possibilidades para o controle do nosso personagem, quanto estivéssemos a pé.

Poderíamos controlar carros, andar com nosso personagem, atirar com diferentes armas e pasme: até mesmo pular obstáculos!

Se isso ainda não fosse o bastante para impressionar os mais exigentes, haveria a possibilidades de controlarmos aviões!

Tudo aconteceria numa cidade viva, com inúmeras possibilidades e liberdade nunca antes vista.

Imagine a situação: o jogo mais avançado que tínhamos naquele momento (nesse estilo) era Driver 2, que parecia ser insuperável, e de repente veio um pessoal prometendo algo que seria pelo menos duas vezes melhor que aquilo.

Parecia bom demais para ser verdade.

O tempo passou, Grand Theft Auto 3 foi lançado e pudemos comprovar que a Rockstar entregou ainda mais do que havia prometido, trazendo um jogo verdadeiramente inesquecível.

Sim, Grand Theft Auto 3 era da nova geração e Driver era da geração anterior, uma comparação direta entre ambos passou a ser injusta.

Mas se antes as pessoas questionavam se a Rockstar Games conseguiria ameaçar Driver, agora a pressão havia mudado de lado.

Será que os desenvolvedores de Driver conseguiriam entregar algo que superaria Grand Theft Auto 3?


A Maior Franquia De Videogames do Mundo

Infelizmente, como todo mundo já sabe, Driver nunca mais conseguiu alcançar Grand Theft Auto.

Teria sido incrível se tivéssemos duas franquias neste mesmo patamar de qualidade.

Muito tempo depois surgiu DRIV3R, um jogo bugado que passou longe de entregar o que Grand Theft Auto 3 entregou.

A franquia nunca mais repetiu o sucesso de seus dois primeiros jogos.

Driver ainda teve bons momentos, principalmente com o lançamento de Driver San Francisco, um jogo que ainda oferecia um mundo aberto, mas voltava a focar exclusivamente na condução dos veículos.

Continua sendo muito divertido até hoje, embora não esteja mais disponível nas lojas digitais, algo que não colabora nem um pouco para manter a franquia viva.

Acontece que quando Grand Theft Auto 3 chegou ao mercado, nós não sabíamos, mas estávamos presenciando o surgimento da maior franquia de videogames que temos até hoje.

Claro que existem outras franquias enormes, mas é difícil deixar de reconhecer que Grand Theft Auto virou um fenômeno da cultura popular, furando a bolha do mundo dos games e alcançando números colossais a cada novo lançamento.

Para muitas pessoas Grand Theft Auto começou no terceiro jogo, muitos fãs sequer experimentaram os dois primeiros.

E isso é apenas mais um fato que comprova o quão revolucionário foi Grand Theft Auto 3.

Grand Theft Auto se tornou uma marca poderosa, e com o tempo foi tornando real tudo aquilo que sonhávamos ter num jogo de mundo aberto.


A Colaboração De Driver Para o Surgimento Dos Jogos De Mundo Aberto

Até hoje me pergunto quanto do sucesso de Grand Theft Auto surgiu da motivação e do desejo de superar Driver.

E consequentemente o quanto Driver colaborou para os jogos de mundo aberto.

Capas de Driver 1 e Driver 2

Não é justo esquecer de Shenmue, que trouxe a verdadeira imersão, com quantidades inimagináveis de interações num mundo aberto.

Mas pessoalmente acredito que o conceito de mundo aberto encontrou sua forma ideal quando a liberdade do jogador ocorria através da direção de um veículo.

A liberdade de interações, somada com a liberdade geográfica em mapas cada vez maiores.

E acho seguro afirmar que a disputa entre Driver e Grand Theft Auto foi um dos acontecimentos mais importantes do mundo dos games.

Um capítulo que curiosamente parece ter caído no esquecimento.


Por Quanto Tempo Durará o Reinado De Grand Theft Auto?

Como todo mundo sabe, Grand Theft Auto 5 foi um sucesso absurdo!

Desde seu lançamento lá em 2013 para a geração Playstation 3 e Xbox 360, o jogo vem sendo atualizado e adaptado para novas plataformas.

Isso é algo que comprova a qualidade do quinto jogo da franquia, mas que também evidencia que estamos a muito tempo sem um Grand Theft Auto totalmente novo.

É inevitável imaginar que neste momento existe um peso enorme sobre os ombros da Rockstar Games, que tem o desafio de repetir ou superar o sucesso de Grand Theft Auto 5.

Um desafio que aumenta a cada dia, levando todo mundo a questionar se eles ainda possuem a mesma magia.

Somente neste ano de 2022, quando Grand Theft Auto chegou às plataformas Playstation 5 e Xbox Series, recebemos a confirmação de que Grand Theft Auto 6 está em desenvolvimento.

Entretanto, pelo lado dos fãs também existem diversas preocupações sobre o novo jogo da franquia.

A principal delas é que a empresa já não é mais a mesma, os maiores responsáveis por essa era de sucesso da franquia já não estão mais lá.

Outra grande preocupação é que as primeiras informações do jogo, ainda que vagas e incertas, dão a entender que Grand Theft Auto abrirá mão de um de seus principais ingredientes: a abordagem incisiva e potencialmente ofensiva de temas polêmicos ou delicados.

Diante de tudo isso, conseguirá Grand Theft Auto 6 manter o nível da franquia?

Ou será que o reinado da Rockstar Games está chegando ao fim?

Já pensou se do mesmo jeito que aconteceu com Driver, surgir um concorrente inesperado para desbancar Grand Theft Auto?

Tudo isso saberemos apenas quando o jogo for lançado.

Se eu estivesse escrevendo a história do mundo dos games, neste capítulo incluiria uma reviravolta onde Driver voltaria das cinzas, revolucionando mais uma vez o mundo dos games e dando “o troco” em GTA.

Mas sinceramente, no mundo real o mais provável é que Grand Theft Auto 6 mantenha o nível de excelência ao qual estamos acostumados.

Se existe uma certeza na vida é que um dia tudo tem fim, mas acredito que ainda não seja o fim de Grand Theft Auto.

Mesmo assim, nunca é demais lembrar da importância que Driver teve em sua época.

Além de relembrar como esta rivalidade não declarada entre Driver e Grand Theft Auto elevou o nível dos games, consolidando os jogos de mundo aberto.

E lamentar porque não importa o quão bom seja o segundo colocado, as pessoas só se lembrarão de quem ficou no primeiro lugar.

Você também se lembra dessa época e dessa rivalidade?

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Abraços e até a próxima!

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